Espaço Tainã Vasconcelos / Imagine all the people


"Você entra no supermercado. As paredes são brancas, as prateleiras são prata, e só. Não há nenhuma cor a mais. O que é líquido está em sacos transparentes, o que é sólido em papelão bruto. Você não precisa se dar ao trabalho de pesquisar preços: todos eles são iguais. O que é mesmo amostra grátis?
A televisão e o rádio deixaram de existir, o mundo é silêncio. De que adiantou a genialidade de nossos grandes inventores se não pudemos arcar com o custo de suas invenções? Pois é, trabalho perdido. Não havia de onde tirar dinheiro para bancar programas de música, de fofoca, as telenovelas, não havia dinheiro para absolutamente nada, entende? Então tudo acabou. E o mundo é silêncio. O jornal não existe mais, o que existe é uma ou outra manifestação de palavra escrita, mas nada com grandes tiragens, porque grandes tiragens exigiriam uma fonte de renda. E você e eu não temos essa fonte de renda, lembra?
As multinacionais ficaram com pouco trabalho a desempenhar. O que é que você faz? Já sabe? Então, resolvido! Qual é o preço que isso vale em todos os países do mundo? Então, pronto. Entrega o dinheiro e leva, em saco transparente ou papelão bruto. Qual é o nome do que você comprou? Não tem nome. Nada mais tem nome, porque não é necessário diferenciar uma coisa da outra. É tudo igual, a sociedade é um padrão. Se você juntar três códigos de barra, não acontece nada. Nem garanto que ainda existam códigos de barra. Pra quê?
E, que pena! Os shows estão entrando em extinção. Você não fica sabendo quando e onde eles acontecem, você não fica sabendo quando alguém lança um CD. E quem é que vai pagar o show e o lançamento do cd? Mais uma vez, pois é. A música não existe mais. Pelo menos não unindo pessoas que estão em lados opostos de um mesmo globo. Ela volta a ser instrumento de memorização, como no princípio de todas as coisas.
Eleição? Democracia? Você está ficando louco! Como é que alguém vai ficar sabendo como se vota, onde se vota, quem é candidato, o que o candidato quer fazer... como é? Você não vai ficar sabendo. Será que a gente vai voltar à ditadura ou ao nazismo? Nem ao nazismo será possível. Porque até para existir o nazismo, foi necessário existir a propaganda.
Ôpa, eu disse propaganda? Mais uma vez, pois é. Publicitário não sabe escrever. Que diabos eu estou fazendo aqui então? Publicitário é vagabundo. Publicitário não faz falta. Não se estuda publicidade porque qualquer um é publicitário. Só salva uma vida quem é formado em medicina. Mas comercial, comercial qualquer um faz.
Será?
Onde fica o respeito por quem passa semanas em claro só para deixar o SEU supermercado colorido e com a SUA música preferida tocando de surpresa no meio da confusão? Onde é que fica a gratidão por alguém que te dá as condições necessárias para que você forme a SUA própria opinião sobre quem deve estar no poder? Se não existisse propaganda, de onde viria a verba para que os canais de comunicação sobrevivessem, e para que o SEU mundo não fosse silêncio em saco transparente ou papelão bruto?
Onde é que fica a gente?
Eu sou de propaganda porque eu gosto da cor, eu gosto da escolha, eu me atraio pelo barulho que o universo faz. Eu não quero memorizar nada, eu preciso saber do cara que fica do outro lado do globo. Eu não sou uma vagabunda e não saberia escrever isso aqui se não estudasse horas a fio o assunto.
Eu quero ser admirada, porque eu sou de Publicidade e Propaganda.""


Tainã Vasconcelos é uma legítima "escritora camelô" que, aos poucos, deixa de ser anônima para virar autônoma. Estudante de publicidade e Propaganda, estaria disposta a escrever até receita de bolo...se soubesse fazer um, é claro. Mas isso já é uma outra história.

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