Foi Bom pra Você? Publicidade com Tesão.

1988. TV. Retículas de cor preta se afastavam da tela lentamente formando uma imagem, enquanto uma voz narrava os grandes feitos de um dos principais personagens do século XX em um comercial à frente de qualquer tempo. No final, a mesma voz faz um contraponto entre verdade e mentira, revelando a imagem e terminando com uma das frases de maior recall da publicidade brasileira.

Para quem estudou publicidade em Jupter e ainda se ligou, eu estou falando de "Hitler", título do filme da W/Brasil (na época ainda W/GGK) para a Folha de São Paulo. Um comercial sedutor, criado pelo Nizan com a direção de criação do Washington Olivetto. Um marco na história da propaganda brasileira em sua época de ouro, criado por dois dos seus principais personagens.

Um filme forte, inteligente e bonito. Bom partido para conquistar qualquer cliente, e sonho de consumo daquelas agencinhas invejosas.

Pois bem. O caso é que eu, como cidadão participativo que sou, estava ontem em casa assistindo ao excitante debate da Globo. Aquela masturbação eterna de um acusando o outro. Brochante. Mas, como ser excitado pela profissão que sou, quase tive um orgasmo quando olhei para a TV e, do nada, vi uma retícula preta se afastando da tela, lenta e sensualmente.



Senti um prazer inexplicável por 1 minuto. Magia? Miragem? Milagre? Não. Era abstinência, mesmo. Abstinência de algum comercial realmente sexy na TV, não essa pornografia barata que existe hoje, que não entretém, não chama atenção, não fode e nem sai de cima. Não essa prostituição da nossa classe, refém do dinheiro de clientes que só porque estão pagando acham que podem gozar na nossa cara, e o pior, na cara do consumidor. Estamos, publicitários e consumidores, reféns de aprovadores de campanha mais preocupados em manter seus cargos do que lutar para que o negócio levante. Mas a culpa é também e principalmente nossa. Enquanto quase nenhum profissional de marketing quer encaixar o pescoço na corda e arriscar, quase nenhuma agência quer por o pau na mesa e protestar.

De repente "Hitler" estava de volta. 22 anos depois, e com corpinho de 22 anos. Eu estava tão compenetrado no ato de ouvir a explosão de sensualidade que é a assinatura que só faltou acender aquele cigarrinho quando o comercial terminou, por conta dos orgasmos múltiplos.

"Folha. O Jornal Que Mais Se Compra E O Que Nunca Se Vende". AAAAhhhh…tssss. Delicinha.

Para os jupiterianos - "Hitler" é um dos dois únicos comerciais ibero-americanos na lista dos 100 melhores do século XX, ao lado de "Primeiro Sutiã", também do Washington (tudo bem que a propaganda é subjectiva, mas se você não gostou desse comercial, você é um virgem. Um jupiteriano virgem).

Ao meu ver, a crise dos profissionais de marketing levou a agência a uma saída de mestre: uma fórmula já testada, aprovada e agora já reutilizada. Da época em que se fazia publicidade pensando em conteúdo. Uma ideia primeiro e uma forma de materializá-la depois, e não utilizar-se das várias formas existentes hoje para esconder a falta de ideia.

Existe um papo de que o público quer segurança, sem correr riscos, e a propaganda tem que refletir isso. Eu, particularmente, acho isso papo de quem tem medo de arriscar. Tipo aquele cara que promete que vai casar com a namorada assim que tiver condições de dar a vida que ela merece. Mas a diferença é que as namoradas podem dar um pé na bunda do cara. E as agências tem medo de fazer isso com o cliente. E por um motivo muito óbvio.

Precisamos de mais sexualidade e menos masturbação na comunicação. Mais atividade e menos passividade, porque já está ficando chato só tomar na bunda. A propaganda tem que comer o público sem camisinha, sem censura. Sem vergonha. Tem que espalhar um vírus pelo coração do consumidor para que ele se apaixone, e invadir o cérebro para que ele reflita.

Mesmo com um mundo de possibilidades hoje, eu torço para a propaganda brasileira evoluir para os anos 80. Não havia tantos meios de se dizer uma coisa, mas havia mais coisas a se dizer.
Talvez eu esteja dando muito importância para isso, mas nós da nova geração precisamos nos inspirar um pouquinho no passado para fazer a propaganda brasileira do futuro.
E "Hitler" reapareceu para fazer a gente pensar exatamente nisso. Que tipo de legado queremos deixar para as próximas gerações da publicidade? O que, no final de nossas vidas e depois de virarmos noites na agência, teremos construído que nos dê orgulho?

"Hitler" pode ser isso, ou um simples flash back de ex namorada: É sempre bom, mas ela lembra que você é um canalha, se arrepende e nunca mais aparece de novo.


Abaixo um filme também revolucionário do jornal Inglês The Independent, criado pela Lowe da Inglaterra eintitulado Litany, lançado numa época de repressão à liberdade de opinião e de imprensa que estava rolando por lá.





Seja qual for o caminho que você escolher, cliente ou agência, faça com tesão.
Eu vou fazer o meu melhor. E gozar no final.



Angelo Campana é um Publicitário beberrão. Um sujeito que mais pensa do que fala, e que nem sempre fala o que pensa. Por isso mesmo se esconde atrás da escrita. Não foi à toa que se tornou redator. Colabora com o blog da Laruccia Studios sobre o mercado da animação e sempre que tem tempo faz um post aqui.

1 Comentário:

Victor Soares disse...

O video fala sobre os "Comerciais que gostaria de ter feito" e eu digo que este post é um "Post que adoraria ter feito". Genial!

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